
24/06/2025
Durante boa parte da minha vida, parecia que eu era um peixe, ou melhor, uma sereia fora d’água. Com mais da metade da minha vida tendo o oceano, literalmente, como lar, você pode imaginar que em muitos momentos desses 41 anos de vida oceânica eu era praticamente única.
Lá atras, há cerca de 50 anos, quando tudo começou, éramos apenas eu e Isabel as duas velejadoras inseridas no universo, então majoritariamente masculino, do Iate Clube de Santa Catarina. Sylvia Earle era a única referência feminina que, como eu, seguia explorando a imensidão azul, impulsionada pela sua formação como oceanógrafa.
Participar da Conferência dos Oceanos da ONU (UNOC), em Nice, teve um efeito paralelo às 23 horas de viagem da Indonésia – onde nossa expedição Voz dos Oceanos se encontra com o veleiro sustentável Kat – para a França, país sede da conferência, co-organizada com a Costa Rica. Ali, me vi em muitas outras mulheres, reconheci a coragem da juventude que não reconhece fronteiras e barreiras e encontrei vozes diversas que se alinhavam num mesmo tom oceânico.
Fiquei orgulhosa da representatividade brasileira e, olhando pelo prisma feminino, me vi ao lado de mulheres em diferentes posições e de diferentes gerações. Marina Silva, Ana Toni e Ana Paula Prates, em posições públicas no Ministério de Meio Ambiente e Mudança do Clima; a professora Marinez Scherer, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e enviada especial setorial para a COP30, representando o Brasil no tema dos oceanos; a Antonia Mascarenhas liderando as ações globais de Educação da Parley, e jovens engajadíssimas, como a Mariana Andrade do Greenpeace, a Marina Côrrea do WWF, a Nathalie Gil da Sea Shepherd, a Carolina Camargo e a Letícia Camargo do PainelMar, a Janaína Bumbeer da Fundação Grupo Boticário, a Mariana Clauzet do Instituto Mar Adentro… Nossa! Tantas mais que eu poderia incluir aqui… Sylvia Earle, querida, definitivamente não estamos sós!
Com a Voz dos Oceanos tenho visto muitas mulheres liderando a pauta ambiental e oceânica e, na UNOC, tive a impressão de que éramos maioria. E isso não é uma declaração feminista, uma guerra entre gêneros. Mas, para aquela velejadora por tanto tempo “solitária”, me emociono em ver que conquistamos espaços importantes e somos protagonistas em tantas frentes ambientais. E, nessa jornada, navegamos ao lado de homens incríveis, que também representaram brilhantemente nosso Brasil. Que bacana ver nosso parceiro no pilar Científico Alexander Turra, da Cátedra UNESCO de Sustentabilidade Oceânica, do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo – USP, sendo referência em Ciência Oceânica para além do nosso país, brilhando em um evento como a UNOC, e estar com Carlos Santos, o Carlinhos da Comissão Nacional para o Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos Extrativistas Costeiro-Marinhos (CONFREM).
E a participação dos nossos baianos queridos, Antonio Rocha, Genilson Brito e Pedro Dantas. Podem me chamar de coruja, tenho orgulho dos jovens do Oxean Hub, da Bahia, que conheci em 2021 quando venceram o hackathon da NASA com o Ocean Ride, equipamento que coleta microplásticos no mar. Desde então, a Voz dos Oceanos os “adotou” como representantes em Salvador, no Brasil e no mundo. Em Nice, estivemos juntos em várias agendas, incluindo o evento que eles mesmos organizaram, “From Salvador to Nice: Think Global, Act Local”, mostrando que uma nova liderança jovem brasileira já ocupa seu espaço na cena global. Como eles dizem: bora impactar o mundo! Sempre sob o olhar talentoso e câmeras atentas de Thiago Sampaio.
Mas o que todos nós vivenciamos em Nice? A programação de uma UNOC é vasta. Impossível estar presente em todos os painéis das Blue e Green zones, por mais interessantes e relevantes que sejam. Precisa focar, organizar bem a agenda e ter preparo físico, porque a conferência é uma verdadeira maratona – foram cerca de 10 km de caminhadas diárias! Participei como painelista em três debates e acompanhei encontros alinhados à missão da Voz dos Oceanos: o avanço do plástico descartável, os impactos da mudança climática, legislações protetivas e soluções que já impulsionam a Economia Azul.
Foi marcante, para mim, o painel “Tackling Plastic Pollution in the Middle East & Beyond: Experiences in Policy and Action” da Sorbonne University Abu Dhabi, no qual representei o Brasil e a Voz dos Oceanos. Dialoguei com cientistas e representantes do MENA (Middle East and North Africa, Oriente Médio e Norte da África em português) sobre soluções conjuntas para os desafios ambientais que nos conectam. Uma troca rica, que reforça a importância da cooperação internacional para proteger os oceanos que nos unem.
Vi nos debates em torno da questão dos resíduos plásticos uma oportunidade muito importante para ampliar e fortalecer os debates que nos levam para o Tratado Global do Plástico que, em agosto, finalmente deve ser definido com o INC-5, na Suíça.
A UNOC recebeu cerca de 60 chefes de Estado e 190 ministros, uma representatividade política surpreendente e celebrada pelo presidente da França, Emmanuel Macron. Ter essas lideranças em uma conferência oceânica é, pelo menos, um sinal de esperança, de que a causa não está marginalizada, tem sua relevância sendo reconhecida.
Mas ainda tem desafios. Os espaços de Blue Finance deixaram evidente que ainda são pouco expressivos e muito aquém do necessário os valores e recursos dedicados ao financiamento de soluções, da proteção efetiva dos nossos oceanos. E as soluções existem! Me impressionei com startups que acreditam nas ONGs e na força das comunidades locais para impulsionar mudanças reais. Muitas delas lideradas por mulheres, ok? E a esperança nesse campo se fortalece ao ver propostas concretas de financiamento para tecnologias regenerativas, economia circular e restauração de ecossistemas marinhos.
A UNOC também sinalizou o próximo grande momento global do debate da causa oceânica: a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. E, em Nice, mostramos que seguimos unidos nessa causa. Um exemplo disso foi a realização do evento “From Nice to Belém: Brazilian civil society invites the global ocean community to discuss the ocean-climate nexus”, promovido pela coalizão das organizações Greenpeace Brasil, PainelMar, Fundação Grupo Boticário, Instituto Mar Adentro / Projeto Ilhas do Rio, Instituto Internacional ARAYARA, WWF-Brasil, Conservation International Brasil, Observatório do Clima e Confrem.
Ao lado destas instituições, seus representantes inspiradores e convidados, entre eles, apresentei o endereço da nossa união, da nossa causa, em Belém do Pará. Preparem-se para a Casa Vozes do Oceano, um espaço imersivo, que estamos construindo coletivamente para ser democrático, acessível e de grande impacto junto à sociedade civil.
E assim me despeço de Nice, retorno à Indonésia, onde embarco de volta no veleiro Kat para, junto com nossa tripulação, seguir a rota traçada. Bons ventos nos levam de volta a Belém, ao Pará, ao Brasil, porque vamos ecoar a voz dos oceanos na COP30!
Fonte: CicloVivo
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