07/01/2025
Para conseguir restaurar áreas devastadas, pesquisadores buscaram inspiração na natureza e estão conseguindo água para mudas de árvores em regiões secas, atingidas pelo desmatamento ou incêndios florestais. A técnica ficou conhecida como “ordenha de nuvens” e, sem a necessidade de energia, extrai água da neblina e garante o sucesso em projetos de reflorestamento.
A ideia começou como um projeto piloto nas Ilhas Canárias onde cientistas decidiram explorar a umidade do ar da região em projetos de reflorestamento. Assim como acontece na natureza, esta água foi condensada, capturada e passou a irrigar mudas de árvores que, de outra maneira, não teriam sobrevivido.
“Nos últimos anos, as Canárias passaram por um severo processo de desertificação e perdemos muita floresta para áreas de agricultura. E então, em 2007 e 2009, como resultado das mudanças climáticas, houve grandes incêndios em áreas florestais que normalmente são úmidas”, disse Gustavo Viera, diretor técnico do projeto Life Nieblas, financiado publicamente nas Canárias.
Viera disse que, após os incêndios devastadores, eles buscaram maneiras de levar água para áreas remotas e montanhosas sem criar infraestrutura ou usar combustíveis fósseis para extrair água subterrânea de poços profundos.
O Life Nieblas (niebla é a palavra espanhola para neblina) começou reproduzindo a maneira como as folhas das espécies locais de loureiros capturam gotículas de água da neblina, usando folhas de malha plástica erguidas no caminho do vento.
Conforme o vento sopra a neblina através da malha, gotículas de água se acumulam e caem nos recipientes abaixo, que são usados para irrigar novas mudas até que elas tenham folhas suficientes para capturar a água por si mesmas.
Entretanto, o vento, embora vital para a estrutura original, provou ser um problema, pois destrói todas as estruturas, exceto as menores. “Precisávamos resolver o problema da fragilidade da rede, minimizando o impacto ambiental”, disse Viera. “Desenvolvemos um sistema que imita agulhas de pinheiro, que são muito boas para capturar água e deixam o ar passar”, explica Vieira.
Nos novos modelos, a água condensa nas finas folhas metálicas das estruturas, replicando a maneira como as coníferas coletam água da atmosfera.
A água é descarregada automaticamente sem qualquer fornecimento de energia ou emissões de CO₂ e nenhuma maquinaria é usada para transportá-la de um lugar para outro. Nenhum sistema elétrico é usado para irrigação e a pegada hídrica também é reduzida, pois nenhum aquífero ou rio é explorado. A única energia necessária é para construir os coletores e colocá-los no lugar.
O sistema desenvolvido para as Ilhas Canárias pode ser facilmente replicado em outros locais e é fácil de transportar para onde for necessário. Com o sucesso do projeto piloto, outros países já estão experimentando a técnica para garantir água potável ou irrigação para reflorestamento e agricultura.
Uma técnica ligeiramente diferente também está sendo aplicada para reflorestar uma pedreira abandonada em Garraf, uma área acidentada ao sul de Barcelona.
“Aqui estamos usando coletores de água individuais do tipo usado para impedir que herbívoros comam plantas jovens”, disse Vicenç Carabassa, cientista-chefe do projeto, que trabalha para o Centro de Pesquisa Ecológica e Aplicações Florestais (CREAF), um instituto público de pesquisa da Universidade Autônoma de Barcelona.“Eles coletam a chuva e o orvalho pesado que cai nas manhãs de verão e também fornecem sombra.”
Carabassa destacou que nem todo tipo de neblina é adequado porque algumas não têm um teor de umidade alto o suficiente. A neblina ideal é a neblina orográfica ou de montanha, que existe em muitas regiões do Mediterrâneo e no norte de Portugal.
“As Canárias são o laboratório perfeito para desenvolver essas técnicas”, disse Carabassa. “Mas há outras áreas onde as condições são ótimas e onde há uma tradição de captura de água da neblina, como Chile e Marrocos.”
O método agora está sendo usado para fornecer água potável e água para irrigação à vila costeira chilena de Chungungo, na província de Coquimbo, enquanto no arquipélago de Cabo Verde, os coletores Life Nieblas, combinados com estruturas de madeira feitas localmente, estão fornecendo 1.000 litros de água por dia, que são usados para irrigar plantações e dar água ao gado.
Todas as informações necessárias para criar coletores de névoa estão disponíveis gratuitamente ao público no site do projeto, e Viera disse que eles receberam muitas consultas. Para acessar o site do projeto clique aqui: https://www.lifenieblas.com/
Os benefícios são palpáveis. Na ravina Barranco del Andén, em Gran Canaria, 35,8 hectares (96 acres) foram reflorestados e 15.000 árvores de várias espécies de louro foram plantadas, com uma taxa de sobrevivência de 86%, o dobro do número do reflorestamento tradicional.
“Recuperamos o potencial da floresta de capturar carbono atmosférico e estimamos que capturamos cerca de 175 toneladas de CO₂ por ano”, disse Viera.
O projeto Life Nieblas não só economiza no consumo de energia fóssil e CO₂, mas também é mais barato e usa menos água do que os sistemas tradicionais de reflorestamento. “Estamos vivendo com a seca em todo o Mediterrâneo e nas Canárias e agora cada gota de água conta”, disse Carabassa, acrescentando que temos que aprender a viver com muito menos água.
“Essa técnica nunca será uma alternativa a uma usina de dessalinização, mas em áreas remotas onde o abastecimento de água é difícil e caro, essa pode ser uma alternativa real.”
Fonte: CicloVivo
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