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Xadrez nuclear: Futuro de Angra 3 pode influenciar liderança do Brasil no combate às mudanças climáticas

02/05/2024

Após quatro décadas de idas e vindas, o futuro da usina nuclear de Angra 3, no litoral fluminense, voltou aos holofotes em março com a abertura de uma consulta pública, disponível até 17 de maio, sobre a conclusão ou não das obras. Elefante branco na matriz energética brasileira, o empreendimento foi paralisado diversas vezes desde o seu lançamento, em 1984, e esteve no olho do furacão da Lava Jato. Agora, além dos fatores domésticos, o debate sobre Angra 3 acontece no momento em que o Brasil busca se firmar como uma liderança climática global e o mundo se divide sobre apostar ou não nessa fonte de energia para reduzir o consumo de combustíveis fósseis — uma vez que os reatores não emitem carbono em sua operação.
Com 65% da obra concluída, a usina de Angra 3 já custou R$7,8 bilhões aos cofres públicos e necessitaria de mais R$20 bilhões para ser finalizada, de acordo com a Eletronuclear, responsável pelo projeto. A expectativa é que a unidade comece a operar até 2028, com capacidade para atender 4,5 milhões de pessoas e produzir 3% do consumo de energia do Brasil. Segundo estimativas do Tribunal de Contas da União (TCU), a desistência da obra levaria a um prejuízo de R$13,6 bilhões.
Para Leonam Guimarães, ex-presidente da Eletronuclear e diretor da Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (Abdan), as indefinições em relação ao empreendimento encareceram o projeto ao longo dos anos. No entanto, ele defende que abandoná-lo seria ainda mais custoso:
— Não tem como comparar o custo de abandonar com o de concluir por uma razão simples: o custo de abandonar seria um dinheiro totalmente perdido, já o custo para construir garantiria 60 anos de geração de energia e segurança energética durante todo esse período.
Em meio à controvérsia, há quem argumente que os R$20 bilhões necessários para entregar Angra 3 — valor cinco vezes maior que o total de doações direcionadas ao Fundo Amazônia até hoje — poderiam ser utilizados para outros fins.
— Em um país como o Brasil, com uma demanda social gigantesca, se esses bilhões fossem investidos em um projeto de energia eólica e solar, seria gerada muito mais energia do que o reator de Angra sem os riscos associados — afirma o cientista Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da USP. — Ainda temos o problema sem solução dos resíduos nucleares, que precisam ser armazenados por ao menos 30 mil anos a um custo altíssimo.
Na avaliação de Rafaela Guedes, especialista em transição energética do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), a geografia do Brasil o coloca em uma posição privilegiada devido à profusão de luz solar e vento. Mesmo sendo fontes intermitentes, isto é, incapazes de gerar energia a todo momento, o país possui outros meios de compensação para garantir sua segurança energética sem precisar de reatores atômicos, afirma Guedes.
— O Brasil é uma potência gigantesca para a produção de renováveis e tem a estabilidade advinda das hidrelétricas para lidar com essa intermitência. Hoje menos de 3% da nossa energia vem de Angra 1 e Angra 2 — pontua. — Países como a França, onde 75% da sua eletricidade vem do uso nuclear, não têm abundância de sol e de vento.
Decidir se o investimento em Angra 3 vale a pena ou não também pode ser um cálculo de política externa. Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se projeta como liderança na área ambiental, a abordagem do governo sobre a usina pode indicar qual tipo de líder o Brasil pretende ser: mais próximo à França, que aposta no setor atômico para alcançar suas metas de descarbonização; ou mais parecido com a Alemanha, que fechou permanentemente seus reatores e vem investindo fortemente em fontes renováveis.
— O Brasil tem se beneficiado de muita hidroeletricidade. O problema é que a hidroeletricidade tem emissões de carbono muito baixas, mas resulta na destruição de grande parte da floresta. O Brasil poderia ser um modelo se simplesmente expandisse suas usinas [atômicas] — aponta o ativista americano Michael Shellenberger, CEO da organização Environmental Progress, em entrevista ao GLOBO durante o Fórum da Liberdade, em Porto Alegre, em abril. — Se quisermos substituir o combustível de transporte [fóssil] por hidrogênio, precisaremos de usinas nucleares para produzir hidrogênio.
Independentemente do caminho, não há soluções perfeitas em se tratando de energia, reforça Artaxo. Segundo ele, a maior parte das usinas na França estão no fim do ciclo de vida.
— Em regimes democráticos, a população não aceita mais a instalação de reatores nucleares próximos da sua região, principalmente por causa dos riscos de acidentes. A França vai ter dificuldade em renovar os reatores que existem hoje — explica. — Os locais onde mais reatores estão sendo construídos são na Rússia e na China, por decisões do governo sem consulta popular.
Durante a conferência climática da ONU (COP28) em Dubai, no ano passado, 116 países se comprometeram a triplicar as capacidades de suas fontes renováveis até 2030, incluindo o Brasil. Na esteira do acordo, 22 nações firmaram um pacto paralelo de triplicar sua geração de energia nuclear até 2050, iniciativa rejeitada pela delegação brasileira. Entre os signatários estão a Ucrânia, marcada pela tragédia em Chernobyl e hoje com sua usina em Zaporíjia ocupada por tropas russas, e o Japão, que ainda tem áreas inabitáveis pelo desastre nuclear em Fukushima, em 2011.
Se a memória dos dois piores acidentes nucleares da História não foi suficiente para arrefecer a expansão atômica de Kiev e Tóquio, o mesmo não se pode dizer de Berlim. O incidente na central de Fukushima provocou uma onda de protestos anti-nuclear na Alemanha, levando o governo da então primeira-ministra Angela Merkel a anunciar o fechamento de todas as suas usinas até 2022. Com o início da guerra na Ucrânia e a subsequente crise energética que atingiu o país, até então muito dependente do fornecimento de gás russo, o prazo para encerrar as centrais foi estendido até abril de 2023. Hoje, mais de 50% da matriz alemã é composta por renováveis.
— A Alemanha tomou uma decisão e estamos passando por uma transição energética, com leis nacionais em vigor para chegarmos a 80% de eletricidade proveniente de energia renovável em 2030 — explica Jennifer Morgan, representante especial da política climática internacional do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha, ao GLOBO. — Nosso grande desafio é continuar sendo um país economicamente próspero, mas alcançar a descarbonização.
Contudo, "o abandono das usinas nucleares pela Alemanha teve como consequência a retomada da exploração de carvão", ressalta Guimarães. Segundo o ex-presidente da Eletronuclear, a iniciativa, paradoxalmente, elevou a emissão de gases de efeito estufa mesmo com a expansão das fontes renováveis, e "hoje corresponde a 4 vezes as emissões per capita da França".

Fonte: O Globo

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